A maioria das vezes que iniciamos um tratamento de reprodução humana assistida fazemos a estimulação ovariana controlada, que nos dará a chance de ter mais óvulos para serem fertilizados. Vamos ver neste artigo porque isto é interessante e quais suas limitações.

O ciclo menstrual

A cada ciclo menstrual a mulher se prepara para uma gravidez, amadurecendo um óvulo para sua saída do ovário e produzindo os hormônios femininos para preparar e sincronizar o endométrio (útero) para recepção do embrião.

Esta sequência sempre é comandada por hormônios sintetizados no cérebro, que modulam a glândula hipófise (localizada na base do cérebro) em sua liberação dos hormônios, que controlam os ovários.

A cada ciclo, 1.000 óvulos são recrutados a terminarem seu processo de preparo para serem fertilizados, e apenas um deles é que será ovulado. Vale dizer que um ciclo menstrual significa um ciclo de preparo para engravidar.

Os óvulos não estão prontos para serem fertilizados e precisam reduzir sua carga genética à metade – 23 cromossomos, para que a fertilização ocorra. Na vida intrauterina, as meninas recebem da crista gonadal, as células que migram para os ovários e que se tornarão os óvulos. É uma quantidade limitada e por isso mesmo na menopausa chegam ao seu fim, com todas as modificações que isto implica.

No nascimento, as meninas têm em torno de um milhão de óvulos, na menarca, início das menstruações e vida reprodutiva, esta quantidade caiu para em torno de 400.000, e a cada ciclo 1.000 serão recrutados, um ovulado e 999 atrofiados e perdidos.

Hormônios que comandam o seu ciclo

Este processo pode ser controlado quando eu dou os hormônios cerebrais, em medicações e que são exatamente o mesmo hormônio natural (FSH e LH) em processos de purificação ou sintetizados geneticamente pela indústria farmacêutica.

Quando eu dou os hormônios, eu passo a controlar este processo, com o objetivo de saber quando ocorrerá a ovulação ou para atrasar o pico de hormônio que faz ovular e assim, mais óvulos chegarem ao ponto de ovulação.

A estimulação ovariana controlada tem estes dois objetivos e serão utilizados conforme sua necessidade. Em inseminações em que preciso colocar a amostra de sêmen preparado dentro do útero, vou estimular pouco e desencadear a ovulação, para saber exatamente em que momento inseminar. Na fertilização in vitro (FIV), quanto mais óvulos tiver, melhor será seu aproveitamento, lembrando que não serão todos aproveitados, mas sim aqueles em metáfase 2, que já tem metade da carga genética.

Na FIV, só no laboratório, através dos microscópios, que saberemos quais óvulos podem ser aproveitados para o tratamento. A identificação dos óvulos é feito em lupas, que aumentam nosso campo de visão, uma vez que eles são muito pequenos para serem vistos a olho nu.

Não é possível ver no laboratório qual embrião será o embrião com a carga genética certa – 46 cromossomos, então se tivermos mais óvulos, mais embriões poderão ser feitos e assim chegarmos ao embrião que vira nenê.

São duas as táticas que melhoram as chances da FIV:

  1. Pular etapas, colocando os embriões diretamente dentro do útero, e
  2. Ter mais embriões para se chegar ao embrião eleito!

A reserva ovariana

Os ovários respondem aos hormônios, mas dependem de sua constituição primordial, quero dizer, que dependem de ter uma reserva de óvulos para responderem ao estímulo hormonal, daí o conceito de reserva ovariana, que pode ser medido por exames de sangue ou por ultrassonografia transvaginal, contando quantos folículos conseguimos identificar nos ovários (CAF – contagem de folículos antrais).

Os hormônios dosados no sangue ou no ultrassom podem dar uma ideia do potencial de estimulação ovariana, mas não dizem nada sobre a qualidade genética destes óvulos. Podemos ter baixa reserva ovariana, mas isto não quer dizer que estes óvulos são ruins; posso ter um folículo, um óvulo, um óvulo fertilizado, um embrião e uma gestação.

A questão é que sempre que tivermos pouco material a ser trabalhado, podemos não terminar esta sequência de acontecimentos. Tendo mais óvulos, maior a chance de ter mais embriões e ter o embrião geneticamente saudável para se tornar um nenê. É uma questão estatística que sempre ronda nossos tratamentos.

Daí sempre a preocupação na avaliação clínica prévia, em se tentar identificar como será a resposta ovariana: baixa, normal ou alta.

Para resposta ovariana normal é que são feitos a maioria dos protocolos de estimulação ovariana: uma quantidade de hormônios que resultará no aproveitamento de 6-8 óvulos para formação de vários embriões.

Paradoxalmente, baixa reserva ovariana não responde com aumentos de quantidade de hormônios à estimulação, por uma série de fatores, que desafiam a ciência a procurar a causa e resposta adequada. As vezes, pouco hormônio faz os mesmo efeito que doses altas para estimulação!

Altas reservas estão muito associadas ao que convencionamos chamar de ovários policísticos- que para simplificar bastante, são ovários que não ovulam mensalmente, mas que quando estimulados, podem responder com muitos folículos (bolha de líquido onde ficam os óvulos e é identificável ao ultrassom) e muitos óvulos. Nem todos os óvulos serão aproveitados, mas iniciando de uma grande quantidade, fatalmente teremos muitos para trabalhar.

Hiperestímulo ovariano

A questão aqui que devemos ter cuidado é que muitos folículos, produzem muito estrogênio, o ponto central de uma série de acontecimentos, que convencionamos chamar de síndrome de hiperestímulo ovariano, com muitos distúrbios hidroeletrolíticos, que podem causar sérios danos e sofrimentos à paciente.

Sempre que se utiliza estes hormônios, a premissa básica é que não se faça indiscriminadamente sem controles. É primordial que se acompanhe a evolução do tratamento, modulando sua resposta e tomando atitudes que evitem acontecimentos indesejáveis e fiquemos somente com os desejáveis: óvulos a mais para seu tratamento.

SOMP – Síndrome dos Ovários Policísticos

Como evitar as consequências do hiperestímulo ovariano

Uma série de atitudes modulam esta resposta, quer em medicamentos, cuidados básicos como a hidratação adequada do paciente e estratégias como não colocar os embriões no ciclo de estimulação, fazem com que seja perfeitamente controlável e riscos baixos de intercorrências e máximo benefício ao final.

É interessante entender que talvez a atitude mais eficiente é não transferir os embriões no ciclo com risco de hiperestímulo. Quando fazemos a estimulação ovariana e controlamos as drogas utilizadas, os efeitos são autolimitados, significa que podemos prever a eficácia e duração dos medicamentos e quando sua ação terminará, normalmente traduzidos com a menstruação que chega após a coleta de óvulos- terminou toda ação hormonal deste ciclo, os ovários voltaram ao normal e podemos tratar de preparar só o útero, sem estimulação ovariana, para transferir os embriões guardados.

Quando não postergamos a transferência embrionária duas coisas podem acontecer:

  1. As modificações hormonais diminuem as chances de gravidez neste ciclo, então não estaremos concorrendo com chances máximas de gravidez;
  2. A gravidez ocorre e com ela o aumento descomunal e sem controle, dos hormônios de manutenção da gestação, muito semelhantes aos utilizados na estimulação ovariana, o que instala o distúrbio metabólico, com difícil controle clínico.

Não é para ficar com medo, e sim para seguir as orientações que passamos e tudo ficará bem com muitos embriões, chave principal de seu sucesso.

A estimulação ovariana é muito necessária para os tratamentos de reprodução humana, otimizando todo este trabalho que é em etapas, progressivo e cheio de esperanças. O que todos queremos é chegar a um resultado positivo, e ele virá, abreviando todas as expectativas inevitáveis à evolução de seu tratamento.

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